Nota da autora do blog: eu vi alguns artigos muito bons e decidi traduzir alguns de vez em quando para vocês. Esse, em especial, eu gostei muito, mas gerou muita polêmica quando foi escrito por comparar Lana e Morrissey. Antes de qualquer discurso de ódio, lembrem-se que música e gosto é algo para todos, não julgue e boa leitura!
Tradução e revisão: Isabela Gomes
Correção: Pedro Américo Castanheira

É difícil, agora, imaginar o quão surpreendente foi quando Morrissey se mudou de Dublin para Los Angeles em 1996. “Uma cidade de bronze indisciplinada e melodramática, de torso duro como pedra, piscinas, grandes carros, estrelas de Hollywood e rappers gangsters”, um jornal impresso britânico escreveu “Parece dificilmente adequado à um artista tímido, livre, afiado e quintessencialmente inglês”. Mas entrando em La La Land ele foi, vivendo em um estilo mediterrâneo com uma mansão em Hollywood Hills construída por Clark Gable e depois pertencente a F. Scott Fitzgerald. Quando Moz lançou em 2004 o brilhante “You are the Quarry”, ele foi entrevistado ao lado de uma piscina em Beverly Hills, se você pode acreditar nisso.



Outra estrela de Los Angeles aparentemente mais em casa com piscinas, grandes carros e estrelas de Hollywood, a cantora Lana Del Rey, de New York, divide mais que apenas uma mudança de cenário com o ícone de The Smiths. Está lá na melancolia, nas armadilhas vintage e na efervescente cultura da personalidade, alimentado pela provocação. Está lá no envolvimento do estilo como uma forma de substância: ela pode ser Brit Lit e ele pode ser meta. Como o Ken Tucker da NPR³ falou uma vez “Ela é o Morrissey com uma raba melhor.

Há cinco anos atrás, um vídeo chamado “This Charming Video Game” deu umas voltas pela internet. Um mashup entre o hit do YouTube de 2011 de Del Rey, “Video Game” e do clássico  jangle-pop de The Smiths de 1983 “This Chaming Man”. Não foi exatamente uma "ideia de gênio", mas conceitualmente, chegou bem perto. Não que a estetização da tristeza que eles compartilham fosse tão clara na época, com o exagero precoce e subsequente retrocesso ao redor da tão chamada inautenticidade de Del Rey dominando a conversa.

O desafio de Lana era provar que a construção de seu mundo tinha um significado deliberado para ela como um avatar glamouroso e melancólico. Morrissey teve o problema quase contrário quando The Smiths emergiram como heróis sombrios.

Apesar do frontman com o cabelo estranho não ter nenhuma necessidade médica para aqueles gigantes óculos do Serviço de Saúde Nacional, sua apresentação de forma irregular, “clumsy-and-shy” foi tratada abertamente como algo completamente sincero, quando sua exaltação extrema fez parte da sensibilidade de Moz o tempo inteiro.

Diferente de outros roqueiros clássicos, com o seu machismo aborrecido e sua auto seriedade, Moz sabia da importância de não ser sincero as vezes. E diferente dos Pop europeus da época, ele se revelou uma ambiguidade: Será que é real?

Com o tempo, as similaridades musicais de Del Rey e Morrissey tem crescido com mais clareza. Não, o trip-hop neblinoso e hip-hop  boom-bap de “Born to Die” lançado em 2012 não lembra as linhas intricadas da guitarra de Johnny Marr do Smiths, mas o traço sonoro de "Ultraviolence" da Lana, lançada em 2014 – as influências de grupos dos anos 60 como The Crystals, cantores pré-rock como Shirley Bassey, o estilo de Roy Orbison, passando schmaltz de Ennio Morricone – pareceu muito alinhado com o próprio Morrissey. The Smiths nasceu a partir de grupos de música femininos afinal de contas – Marr e Mozz se conectaram por conta de um Marvelettes B-Side – e Morrissey trabalhou com o já mencionado diretor e lenda Morricone em uma balada solo não-tão-diferente-de-Lana chamada “Dear God,Please Help Me”.

Não é tão estranho sair de “SadGirl” de Lana para “Heaven Knows I’m Miserable Now” do The Smiths, para “MoneyPower Glory” e então para “All You Need Is Me” do Moz. Elas emocionam, animam e transformam tracklists em atrevidos trabalhos de arte. Ela é enamorada por homens maus (e James Dean); Ele atraído aos doces e sensíveis hooligans, caras fortes e marginais (e James Dean). Morrer ao lado de uma amante – seja em “Summertime Sadness” ou “There is a Light that Never Goes Out” – iria ser uma forma divina de morrer.  

       
  
 O állbum de Del Rey de 2015, "Honeymoon", só aumentou suas semelhanças com Morrissey. É uma orquestra opulenta destacando suas auto-absortas frases com reviravoltas e curvaturas; Obviamente que Morrissey iria pensar em abrir uma música eventualmente com “Nós dois sabemos/ que não é elegante me amar” se ela não tivesse feito antes. O sabor de mundo antigo do álbum – nas letras italianas e na orquestração estilo Poderoso Chefão de “Salvatore”, ou na percussão do latim “24” – na verdade se alinhou com o estilo Europeu e com a guitarra flamenco do último álbum de Moz de 2014, "World Peace Is None Of Your Business" e quando, na faixa imersa em Jazz "Art Deco", ela implantou a nova giria 'so ghetto', ela destacou mais um ponto pouco confortável e comum entre os dois.

Até o observador mais casual de Lana ou Morrsey irá reconhecer ambos como constantes fontes de controvérsia. Com Del Rey, um pouco da indignação pode novamente ser relacionado com ela não recebendo tanto crédito por saber exatamente qual jogo está jogando quando ela canta “My pussy tastes like Pepsi Cola”, ou quando dá ao entrevistador um grande título falando “Eu queria já estar morta”. Com Moz, o erro pode ser esperar que o homem que nos assegurou ser humano e precisar de amor tratar as notícias do mundo com uma vulnerabilidade similarmente bajuladora. Em meses recentes ele direcionou um muito criticado discurso no bombardeio de Manchester, acusando a imprensa de ser injusta com o rebento francês fascista Marine Le Pen e vendeu ao James Baldwin uma camisa escrita “preto é como eu me sinto por dentro”, transformando uma letra de The Smiths em algo com um tom racista e nada musical, você poderia quase confundir o erro por uma “trolação” calculada.

 Pode parecer constantemente que LDR e Moz dividem audiências como se isso fosse o trabalho deles, ou talvez é exatamente assim como eles veem. Suas tomadas em contenciosos discursos são debatidas porque ao invés de oferecerem uma certeza moral, de um jeito ou de outro, tem um elemento de gentileza em jogo. Do já professado desinteresse de Lana no feminismo até o lamento de Moz quanto as falhas tentativas de assassinato contra Margaret Thatcher, um não pode deixar de imaginar: será essa a visão da pessoa, ou do personagem? Com esses dois, a diferença parece importar menos que a pura provocação. Como o escritor preferido de Moz, Oscar Wilde, uma vez colocou “Em questão de grave importância é o estilo, e não a sinceridade, a coisa vital”.

A maior similaridade entre Lana Del Rey e Morrissey pode não ser a tendência morosa ou o quanto ambos apreciam “He Hit Me (And It Felt Like a Kiss)”, mas sim a habilidade de ambos superiorizar suas canções e personagens, como estrelas e mitos. No trailer de “Lust for Life”, o último álbum lançado de Lana, ela vaga no H da placa de Hollywood – uma referência a Peg Entwistle, a jovem atriz que pulou para sua morte da mesma letra em 1932 e rumores dizem que ela o assombra até hoje. Você pensaria que Morrissey iria amar essa jogada, toda amarrada em uma iconografia pesada. “Eu sou um pecado vivo”, ele cantou uma vez, e isso foi bem antes de chegar a Hollywood.

         

Brit Lit: No dicionário inglês é Literatura Britânica; Literatura atual elegante.
Meta: Um termo, especificamente na arte, usado para caracterizar algo que é caracteristicamente auto referencial.
NPR: National Public Radio; Uma organização de comunicação social, sem fins lucrativos e de titularidade pública do Governo dos Estados Unidos.
Schmaltz: Trabalhos artísticos, como música ou escrita, que tem a intenção de causar fortes sentimentos tristes ou românticos, mas sem qualquer real valor artístico. 
Hooligans: vândalos
Você pode encontrar o artigo original aqui.


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